Reflexões sobre a participação das redes sociais no caso dos protestos na Turquia
Ontem a Amanda Pereira entregou seu artigo científico sobre cidadania 2.0 lá na Universidade Potiguar em Natal (RN). Assim como ela, seja no latu ou stricto sensu, muitos estão refletindo sobre as implicações da “era das redes sociais” na política e na cidadania.
Pretendo pontuar alguns fatos que considero relevantes para aqueles que estudam esse tema, mas antes um resumo do ocorrido até então:
Na semana passada aconteceram protestos no parque Gezi em Instambul, contra um projeto urbanístico que prevê a extinção do parque para dar espaço a um centro comercial, um centro cultural e uma mesquita.
Os protestos se prolongaram nos dias seguintes, passando também a questionar não só a reforma urbanística, mas toda a política do partido islamita do primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan. A reforma seria uma alternativa utilizada pelo governo para privatizar áreas públicas por conta da escassez de espaços urbanos livres para aproveitamento do setor imobiliário e da construção civil.
Os movimentos de protesto começaram então a surgir também em outras cidades da Turquia. No quinto dia consecutivo de manifestações, a polícia decidiu retirar à força os manifestantes do parque Gezi e foram acusados de uso excessivo da violência, fato que fez o governo pedir desculpas alguns dias depois por conta dos feridos durante a repressão policial.
Na cidade de Esmirna, 25 pessoas foram detidas por publicação de “informação errada” no Twitter. O primeiro-ministro já havia dito que o Twitter era uma “ameaça” utilizada para propagar “mentiras”.
Ao perceber que havia sintomas de censura na política adotada pelo governo turco, um grupo de manifestantes criou, dentro da rede de crowdfunding Indiegogo, um projeto para arrecadar dinheiro para publicar um manifesto no jornal The New York Times, com o propósito de garantir exposição internacional sobre a opressão na Turquia.
O objetivo era alcançar cerca de 53 mil dólares, valor referente à publicação de um anúncio no jornal. Em cerca de uma semana, o grupo já tinha alcançado mais de 90 mil dólares em doações feitas pela rede Indiegogo.
O manifesto que será publicado no The New York Times é esse:
Para aqueles que estudam a dinâmica dos meios de comunicação e a influência das redes sociais na sociedade, vale considerar alguns pontos:
- O ativismo (ou mobilização) de sofá é considerado por alguns como um recurso inócuo para a política, pois nasce o morre dentro das redes sociais, sem interferir efetivamente no processo político. Esse caso na Turquia mostra como a colaboração através da simples doação de recursos financeiros tem papel fundamental para aqueles que efetivamente estão envolvidos na manifestação. O ativismo de sofá é capaz sim, de potencializar ações efetivas.
- Assim como em outros casos de protestos, fica evidente a importância que as redes sociais assumiram como ferramenta mobilizadora da sociedade. Ela é utilizada tanto para a organização dos manifestantes quanto para repercussão dos acontecimentos, tanto que a polícia turca chegou a prender alguns manifestantes por divulgarem fatos pelo Twitter.
- Por fim, esse caso mostra ainda o valor dos veículos de massa, mesmo na “era das redes sociais”. A imprensa, através dos seus canais de massa, é fundamental para ampliar o impacto da informação. É através dos veículos de massa que a mensagem alcança segmentos diferentes da sociedade e quando envolve o jornalismo, é capaz também de legitimar o discurso. Os primeiros fatos são propagados entre pares nas redes sociais (usuários com alguma afinidade). Quando os fatos são coletados e publicados em um veículo de massa, ele atinge outros grupos da sociedade e mais uma vez, é devolvido às redes, agora com um novo potencial de repercussão espontânea. Esse é um ciclo dinâmico que permanece até o esgotamento completo da mensagem.
Cientes dessa dinâmica, um grupo de manifestantes resolveu criar uma ação colaborativa nas redes sociais que tem como propósito alcançar exposição em um veículo de massa de grande impacto. Ou seja, hoje os canais de massa e das redes vivem em uma relação de sinergia.
A quem se interessar, abaixo estão alguns links com mais informações sobre o caso.
- Turquia: crowdfunding paga anúncio no NYT
- Mídia local fala de pinguins e não fala de nós, diz manifestante na Turquia
- Editorial: Apreensão na Turquia
e falando em revoltas e mundo árabe vale a pena dar uma olhada nessa minha palestra no TEDx FIAP sobre Egito e facebook, eu tinha acabado de voltar do Cairo logo depois da Primavera Árabe http://bit.ly/Zu08bM
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