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E você pensava que estava abafando com seu anúncio inovador

Nāo podemos esquecer: ninguém gosta de ver propaganda, só nós mesmos.

A coluna desta semana da Suzana Singer na Folha de S. Paulo inspirou-me para esse post. Confesso, quando vi pela primeira vez, fui imediatamente para o Twitter elogiar e replicar o link do novo filme da Johnnie Walker. O filme "Keep Walking, Brazil" tem um conceito muito bom, ótimo texto e imagens. O resultado final é impactante.

E vale ressaltar, trata-se de um filme publicitário, daqueles que vemos no intervalo da televisão e cansamos de criticar. Propaganda em meios tradicionais já não atinge nem envolve o consumidor. O telespectador está cansado de ser interrompido pela propaganda. Não quando é bem feita.


Porém, para fugir do tradicional e inovar, estamos recorrendo a novos modelos e formatos. Contextualizar é a palavra-chave. Fazer a propaganda ganhar a forma de um conteúdo, e não de um anúncio publicitário. Johnnie Walker fez isso. A versão impressa dessa mesma campanha não tinha cara de anúncio. Mais uma vez, fui ao Twitter mostrar para minha rede de relacionamento a capa falsa da edição do domingo da Folha de S. Paulo (09/10/2011).


O grande problema é que, em meio ao furor criativo, esquecemos como essas ações podem beirar a enganação. Aqueles que viram o filme na TV, bem como os consumidores da marca e principalmente, todos os publicitários, acharam o máximo ver a referência ao filme, na capa da Folha, em forma de uma manchete.

E os demais leitores, que compraram/assinaram o jornal esperando ter acesso às principais notícias do dia? Como eles reagiram ao ler a manchete "Pão de Açúcar era parte de um gigante"? Acredito que para virar tema da coluna de domingo da Suzana Singer, Ombudsman da Folha, a repercussão negativa foi considerável.

Em 2007, relatei neste blog um caso infeliz da Citroën, ocorrido durante o lançamento do C4 Pallas. A peça da campanha simulava a notícia de um asteroide que iria se chocar contra a Terra. Clique aqui para ver o desenrolar deste caso.

Considero essencial o exercício da reflexão crítica que o publicitário deve fazer em relação ao seu próprio trabalho. Por conta disso, tomei a liberdade de reproduzir na íntegra (com autorização da autora), o belo texto da Suzana Singer. Vale a pena ler e refletir:



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PARECE, MAS NÃO É
"Informes publicitários" que cobrem a Primeira Página e simulam ser a capa irritam os leitores

Desde que o ex-presidente José Sarney deixou de ser colunista, só um ponto consegue a proeza de irritar leitores de "esquerda", de "direita", corintianos, palmeirenses, jovens e mais velhos: os anúncios que cobrem a Primeira Página.

Na última semana, os publicitários estavam especialmente criativos. A capa de domingo passado imitava os tipos gráficos da Folha, os fundos coloridos, e dizia em manchete que o "Pão de Açúcar era parte de um gigante". Abaixo, uma série de notícias inventadas, com direito até a previsão do tempo. O objetivo era chamar a atenção para uma nova campanha de uísque.

No dia seguinte, outra primeira página falsa, só de boas notícias. Essas não foram criadas em uma agência, foram pinçadas do noticiário real para avisar que empresas de telefonia também tinham uma "ótima" novidade para o leitor.

"Nunca gostei de anúncio em cima da capa, mas esses últimos me incomodaram demais, porque se travestiram de reais. O formato era traiçoeiro", reclamou o radialista Rodolfo Mieskalo, 29.

Outros leitores se queixaram de "dois dias seguidos de propaganda nonsense" e de "o jornal vender um espaço sagrado como a sua capa". Anúncios que cobrem a Primeira Página, em parte ou totalmente, deveriam ser excepcionais, mas são cada vez mais comuns. Neste ano, foram 88 -um a cada três dias.

Em geral, são propagandas de supermercado, carro ou banco, facilmente identificáveis, que irritam por atrapalhar o manuseio do exemplar. Só que esses últimos foram além e tentaram enganar o leitor, o que não deveria ser permitido. "O jornal não aceita anúncios que imitam os tipos gráficos da Folha. Além disso, há sempre, com destaque, o aviso de que se trata de informe publicitário", diz a Secretaria de Redação.

O anunciante não poderia também saber de antemão o que será publicado, como aconteceu na segunda-feira. O "informe" selecionou notícias e fotos da Redação para justificar o título: "Uma capa de jornal só com notícia boa. Você queria, a gente fez primeiro." Foi intromissão indevida na área editorial.

A Secretaria de Redação explica que o departamento comercial teve "acesso restrito e supervisionado ao índice de notícias do jornal".

Outro ponto que deixou alguns leitores mais indignados foi o fato de o anúncio de domingo ser de bebida alcoólica. "Qual a credibilidade de um jornal que vende a manchete principal para campanha de uísque?", criticou Luciana Sendyk, 47, redatora publicitária.

Em editoriais, a Folha apoia limites à publicidade do álcool. "O jornal defende restrições de acordo com o que estabelece a Constituição, que cita rádio e TV aberta. Esses meios são objeto de concessão pública e atingem um público universal, sem distinguir crianças de adultos. Por essa dupla razão, justificam regulamentação legal mais estreita da propaganda de produtos nocivos à saúde", justifica a Secretaria de Redação.

A verba publicitária é fundamental em qualquer jornal -na Folha, representa cerca de metade da receita geral da empresa. Sem ela, o jornal custaria mais caro e seria lido por menos gente. Mas é imprescindível impor limites ao comercial, principalmente, quando se trata de cobrir a vitrine do jornal.

Crédito: SUZANA SINGER - Jornal Folha de S. Paulo, 16/10/2011, pág. A8.  http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ombudsma/om1610201101.htm







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